A Alsácia e seus brancos maravilhosos
A Alsácia é uma região localizada a leste da França, próxima à fronteira com a Alemanha, às margens do rio Reno. A cultura do vinho foi trazida pelos romanos quando ali se estabeleceram. Com o declínio do seu império, a região foi invadida por germânicos, que foram posteriormente expulsos pelos francos. A Alsácia durante séculos esteve sob o domínio desses povos, alternadamente. Para encurtar, trazendo para um período histórico mais recente, no século XIX, após pertencer à França, foi reunificada à Alemanha, ao final da Guerra Franco-Prussiana e, com o término da Primeira Guerra Mundial, voltou ao domínio francês. Nesse período, os habitantes que tinham vindo de outras partes da Alemanha foram expulsos. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi novamente anexada à Alemanha e os alsacianos foram obrigados a se alistar como qualquer cidadão alemão. Com o final da guerra, ainda em 1944, a região passou definitivamente a pertencer à França.
Fiz esta introdução, pois acredito que para melhor conhecer os vinhos do velho mundo é importante lembrar um pouco da história e geografia do lugar. Assim, tendo sido ao longo de toda a sua história objeto de disputa com a Alemanha, é óbvio que a influência deste país é muito presente no cotidiano e na cultura da Alsácia, refletindo-se diretamente nos seus vinhos e na sua gastronomia, e obviamente na arquitetura de suas belas cidades.
A região da Alsácia possui 3 AOC (appellation d’origine contrôleé), que é como se chama em francês a denominação de origem controlada (DOC): AOC Alsace, AOC Alsace Grand Cru e AOC Crémant D’Alsace. Na França ainda é comum utilizar a designação AOC ao invés do equivalente substitutivo estabelecido pela UE, DOP (denominação de origem protegida) que em francês é AOP (Appellation d’Origine Protégée).
Além das normas estritas, que regulam a produção, a origem geográfica e as uvas utilizadas, no caso alsaciano, a AOC estabelece até a utilização das garrafas tradicionais compridas, do tipo flúte, de coloração esverdeada, similares às garrafas dos vinhos alemães que estamos habituados.
A AOC (AOP) Alsace é a principal, que reponde por 74% da produção e que traz nos seus rótulos o ano da safra e a descrição da uva. Aliás, o vinho da Alsácia é um dos pouquíssimos da França que especifica no rótulo a varietal. A utilização de cortes é rara, ou seja, quase todos os vinhos são feitos com uma única uva. A segunda denominação da região é a AOC Alsace Grand Cru, sendo que cru é um termo em francês utilizado para denominar um vinhedo específico ou zona delimitada (terroir). Esta AOC cobre 51 crus, delimitados segundo critérios geológicos e climáticos estritos. Os rótulos, além de indicarem a denominação da cepa e o ano da safra, devem precisar o nome do cru de origem, que são nomes em alemão (ex. Altenberg de Bergbierten, Kastelberg, Furstentum, Engelberg, Brand, Sporen, Spiegel…). Os Alsace grands crus respondem por apenas 4% da produção da região, mas são, na minha opinião, as jóias da coroa. Por fim, temos a AOC Crémant D’Alsace referente aos espumantes produzidos na região, que são os restantes 23% da produção. São espumantes (crémants) leves, fabricados pelo método tradicional, aquele onde a segunda fermentação ocorre na garrafa, e bastante populares por oferecerem alta qualidade por bons preços.
Com relação às castas da Alsácia, a pinot noir é a única uva tinta plantada na região e ocupa apenas 10% da área cultivada. A Alsácia definitivamente não é a praia dos tintos, mas é o paraíso dos brancos! As estrelas da região são realmente as uvas brancas, responsáveis por vinhos majestosos, de agradáveis aromas e capazes de acompanhar bem diversos pratos. A cepa rainha é a riesling, que gera vinhos secos, com notas cítricas, mineralidade e acidez viva. É considerada uma das mais elegantes uvas brancas do mundo e brilha tanto na Alsácia quanto na sua vizinha Alemanha. Em seguida, cabe destacar a uva gewurztraminer, que origina vinhos agradavelmente aromáticos, com um intenso buquê de flores e frutas. A partir dessa uva também são produzidos vinhos para sobremesa, que são mais doces, chamados de vendange tardive (colheita tardia), verdadeiros néctares. Além destas uvas são plantadas na região as castas muscat, pinot gris, pinot blanc e sylvaner.
As 4 castas mais importantes e consideradas as “castas nobres” da Alsácia são: riesling, gewurztraminer, pinot gris e muscat. Estas 4 forma durante décadas as únicas presentes nos grand cru e nos vinhos doces de colheita tardia, os vendages tardives.
Na verdade, como toda regra tem sua exceção, até 2022, existia apenas uma exceção para os 51 Grands Crus, com a Sylvaner sendo aprovada no Grand Cru Zotzenberg. Entretanto, a partir de 2022, o seleto clube foi ampliado, com a inclusão da Pinot Noir, que se produzida em detyerminados vinhedos classificados como Grand Cru, pode ser engarrafada como um Grand Cru Alsace AOC.
Visitei diversos produtores, entre eles: Marcel Deiss, Paul Blanck, Dopff au Molin, Hugel & Fills, Arthur Metz, Trimbach…
Estrasburgo é a capital da região e pode facilmente ser alcançada após duas horas de trem de Paris. De lá, é possível alugar um carro e iniciar o passeio pela Rota dos Vinhos da Alsácia, que oferece ao longo de 170 km, belos cenários repletos de vinhedos, castelos medievais, centenas de produtores de vinhos e dezenas de vilarejos lindos, muito próximos um do outro e totalmente estruturados para o turismo. Destaco Riquewihr, uma das mais charmosas vilas da rota, com seu bem preservado centro histórico e muralha; Ribeauvillé, sua bela vizinha; e Kaysersberg, que também merece uma parada. Todas são rodeadas por vinhedos e zonas de grand cru. Vários produtores ao longo da rota oferecem degustação e venda a varejo de seus vinhos. Além de Estrasbugo, a imperdível Colmar, mais ao sul da rota, também é uma boa opção de base para explorar a região.
Os vinhos da Alsácia não são considerados caros na França, podendo ser uma ótima opção em restaurantes e bistrôs. No Brasil, é possível encontrar alguns vinhos alsacianos de ótimos produtores.
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A produção de leite não escapa a essa evolução.
Excelente. Parabéns pela reportagem que inclui a história e geografia da região como a apresentação dos vinhos ali produzidos.
Caro Elson, muito obrigado pelo elogio. Fico feliz que tenha gostado. Esta é a linha que pretendo seguir no blog, trazendo sempre temas de interesse para curiosos, iniciantes e iniciados no mundo do vinho. Convido você para curtir minha página no facebook, vinhos com fernando lima. Abs.