Gostaria de apresentar alguns dados mais recentes sobre o mercado do vinho, fornecendo um panorama atualizado do cenário mundial e brasileiro do setor.  São informações essenciais não somente para profissionais que atuam no mercado do vinho, mas também para os enófilos e consumidores, que acredito que acharão interessante conhecer mais sobre a produção e consumo de sua bebida favorita através dos números apresentados.

Este post foi motivado pela recente “Press Conference” realizada em 20/04/2021 pela INTERNATIONAL ORGANISATION OF VINE AND WINE (OIV), que anualmente apresenta os  dados mais recentes do setor. A OIV é um organismo intergovernamental de caráter científico e técnico de competência reconhecida no domínio das vinhas e do vinho,  das bebidas à base de vinho, das uvas de mesa, das passas secas e de outros produtos derivados da vinha.

A OIV tem como missão principal atuar no aconselhamento, na padronização e no apoio aos diferentes players da cadeia econômica da viticultura, em especial nos atos normativos dos Estados membros. A organização orienta  e produz trabalhos científicos, podendo também participar em processos de regulamentação da vitivinícola dos países membros. Além dos dados da OIV, ao final seguem dados específicos do mercado brasileiro, obtidos de diversas fontes.

1) PAÍSES COM MAIOR SUPERFÍCIE DE VINHAS PLANTADAS EM 2020

Os 6 primeiros países (Espanha, França, China, Itália Turquia e EUA) respondem por 56% da superfície total de vinhas plantadas. Caso a presença da Turquia nos TOP 6  cause estranheza, vale  lembrar que a Turquia é um  dos maiores exportadores mundiais de uvas passas.

2) PRINCIPAIS PAÍSES PRODUTORES  DE VINHO EM 2020

Os 3  maiores produtores de vinho (Itália, França e Espanha) respondem por mais da metade da produção mundial (53%),  os TOP 8 países vinificam aproximadamente 78% do total mundial e vem da União Europeia  63% do total de vinhos elaborados no mundo!

3) CONSUMO DE VINHO POR PAÍS EM 2020

O Brasil ocupa a 13ª posição, consumindo 4,3 milhões de hectolitros (mhl), ou seja, 430.000.000 litros de vinho.

O ano de 2020 foi muito complicado devido à pandemia provocada pelo COVID-19 sendo que o hábito de consumo de vinho de cada país é muito heterogêneo e extremamente sensível a fatores culturais e mercadológicos locais. As atitudes de cada país com relação ao enfrentamento do vírus também tiveram influência direta no consumo de vinho. Se por um lado o isolamento social e políticas de lockdown, variando de grau conforme cada país, causou queda na venda de vinho através dos canais tradicionais de HoReCa (hotéis, restaurantes e cafés); por outro registrou-se um aumento significativo do consumo residencial, através da aquisição de vinho por meio de outros canais de distribuição como o e-commerce. No Brasil, quem já possuía venda online consolidada registrou crescimento, já os que não atuavam neste canal foram forçados a rapidamente se adaptar para sobreviver.

Os cinco países maiores consumidores de vinho  em 2020 responderam por quase 50% do consumo mundial total e se expandirmos para os  TOP 10 países, engloba-se 70%  do consumo mundial de vinho em 2020.

Acima vimos o consumo anual em milhões de hectolitros (mhl) por país e abaixo segue o consumo per capta que mostra números bastante interessantes:

• o Brasil ocupa a 13ª posição em consumo por volume com 4,3 mhl,  registrando em 2020 o baixíssimo consumo de 2,6 litros per capta de vinho. Sei que se dependesse de mim e dos que acompanham o blog, este valor seria pelo menos 10 vezes maior! rsrsrs.  Vejam só o meu raciocínio, para registrarmos um consumo per capta anual de cerca de 20 litros, bastaria um casal consumir apenas 01 (uma) garrafa de vinho por semana ao longo do ano  (52 semanas no ano x 0,750 litros / 2 pessoas), o que é muito pouco. Ou seja, o Brasil ainda é um mercado com muito potencial para crescimento.
• O TOP 5 países em termos de  consumo per capta são europeus, sendo que a liderança, por anos consecutivos, permanece com Portugal com 51,9 litros per capta. Veja que abismo em relação ao consumo per capta brasileiro.
• Em termos de volume, o EUA é o maior mercado consumidor de vinhos, mas o consumo per capta ainda é bem abaixo dos padrões europeus, com 12,2 litros per capta. Ainda assim, é cerca de 6 vezes superior ao nosso.
• Nossos hermanos argentinos possuem um elevado consumo per capta (27,6 litros), ocupando a 9ª posição em termos de volume de vinho consumido (9,4 mhl).
• A China aparece na última posição dentre os países analisados, consumindo 1 litro per capta em 2020, mas ocupa o 6º lugar em consumo por volume.
• Qualquer aumento per capta no consumo dos americanos, chineses e brasileiros teria influência sensível no consumo mundial de vinhos em termos de volume, devido ao elevado número de habitantes destes países em relação aos demais analisados.

E como estamos em comparação somente com nossos hermanos latino americanos? Veja abaixo os dados obtidos em outra pesquisa:

Num treinamento online para profissionais que fiz em 2020 realizado pela Wines of Argentina foram apresentados dados que achei muito interessantes referentes ao consumo de vinhos, em milhões de garrafas, em algumas cidades do mundo. Notem que Buenos Aires é a segunda cidade onde mais se consome garrafas de vinho no planeta! Fica atrás apenas de Paris, que é a cidade mais visitada do mundo. Acredito que os turistas brasileiros tenham uma participação relevante nestas 457 milhões de ampolas de 750 ml consumidas em 2019 na capital portenha!

4) PRINCIPAIS EXPORTADORES MUNDIAIS DE VINHO EM 2020 (POR VOLUME E POR VALOR)

Ao analisar os gráficos acima observem que há variação de posicionamento dos países conforme o critério utilizado para mensurar  o total de exportações realizadas: Valor (em bilhões de euros) ou Volume (em mhl). Por exemplo, observem as curiosidades abaixo:

• a França é o maior exportador mundial de vinho em bilhões de euros, mas ocupa a 3ª colocação se levarmos em conta o volume total exportado. Ou seja, o valor agregado médio de suas exportações é superior ao valor médio dos vinhos exportados pela  Itália e Espanha.
• o volume de vinhos exportados pela Nova Zelândia não foi capaz de incluí-la entre os TOP 10 exportadores mundiais em termos de volume, mas o valor agregado de seus vinhos foi suficientemente alto  para incluir o país na 7ª posição entre os maiores players em termos de bilhões de euros exportados.
• já a África do Sul exporta muito vinho em termos de volume, figurando na 8ª posição; mas este volume em termos de valor não foi capaz de incluí-la entre os TOP 10 países em termos de bilhões de euros exportados.

Ainda nos gráficos acima, temos que a cor verde representa as garrafas, a amarela são os espumantes (sparkling), a rosa são os bag in box (BiB) e a cor roxa são os vinhos exportados à granel (bulk). Assim, abaixo seguem os 3  países que são os maiores exportadores mundiais de acordo com cada uma destas categorias, segunda a OIV:

5) CONSUMO DE VINHOS IMPORTADOS NO BRASIL EM 2020

Os dados abaixo foram divulgados pela Product Audit International e compilados pelo especialista  Marcelo Copello, que há anos acompanha o mercado brasileiro. O consumo per capta de 2,0 litros em 2020 difere um pouco dos 2,6 litros divulgados pela OIV e isto deve-se provavelmente à metodologia aplicada em cada pesquisa. O mais interessante é que Copello mostra bem a evolução no consumo de vinhos no Brasil a cada ano, além de destacar  o consumo de vinhos tranquilos do total que também inclui os vinhos espumantes.

Abaixo seguem dados divulgados pela Baco Multimídia, referente aos 3 estados brasileiros com maior consumo per capta de vinho (RS, RJ e SP):

Com relação às importações, houve crescimento de 29,2% em volume e 16,9% em valor. É um crescimento considerável se levarmos em conta o dólar alto e o ano atípico devido à pandemia. O vinho chileno lidera as importações brasileiras tanto em termos de volume como de valor. Em termos de volume de importação, Portugal ocupa o 2º lugar  e o 3º fica com  a Argentina. Já na balança comercial, em termos de milhões de dólares de vinhos importados pelo Brasil,  a Argentina fica na 2ª posição e Portugal na  3ª.

O Brasil é um  mercado importante para os vinhos chilenos, argentinos e portugueses.  Vejam como estamos posicionados nas exportações de vinhos destes países.

• CHILE: Brasil é 1º mercado em volume e 2º em valor
• PORTUGAL: Brasil é o 4º mercado
• ARGENTINA: Brasil é o 3º mercado

Os vinhos tintos são os preferidos dos brasileiros, representando aproximadamente 80% do total consumido. Muito atrás vêm os vinhos brancos  com 10%, seguidos pelos espumantes com 7% e pelos rosés com 3%.

6) CONSUMO DE VINHO BRASILEIRO

Para finalizar, seguem alguns dados interessantes referentes ao consumo de vinhos nacionais no Brasil. Segundo pesquisa realizada pela IDEAL CONSULTING, os vinhos nacionais representam 73% do total de vinhos consumidos no Brasil. Neste total estão incluídos os vinhos finos e de mesa, além dos espumantes. Só pra lembrar:

• Vinho Fino é aquele elaborado com uvas viníferas (videiras da espécie vitis vinifera), que são aquelas que possuem pelo menos 1/3 de concentração de açúcar em relação ao seu volume. Das videiras vitis vinifera provêm praticamente todas as uvas mais conhecidas, de origem euroasiáticas, empregadas na vinificação há milênios.  Ex: cabernet sauvignon, merlot, syrah, cabernet franc, chardonnay, sauvignon blanc, malbec, touriga nacional, etc; e
• Vinho de Mesa é aquele elaborado com uvas “não viníferas” (vitis labrusca, vitis bourquina ou híbridas, normalmente americanas). Ex: lorena, niágara, goethe, isabel, bordô, concord, etc. O vinho de mesa representa quase 70% de todo o  vinho consumido no Brasil.

Se levarmos em conta apenas o consumo dos vinhos finos, os nacionais respondem por 13% do mercado:

Abaixo segue interessante tabela compilada por Marcelo Copello que mostra que o vinho fino brasileiro ficou em 2º lugar dentre os vinhos consumidos no Brasil em 2020, ficando atrás apenas dos vinhos chilenos. O vinho brasileiro ocupava a 4ª posição em 2019, registrando crescimento de 77%.

Não poderíamos deixar de falar dos espumantes, que são o orgulho nacional. Segundo dados específicos de consumo de vinhos espumantes no Brasil que foram publicados em edição especial da Revista BACO, o espumante nacional responde por 77% do volume total de espumantes que consumimos!  Sorte nossa que possuímos uma enorme oferta e variedade de espumantes de alta qualidade elaborados em diversos estados do Brasil: RS, SC, PR, SP, MG, PE/BA…

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES

• Mesmo 2020 sendo um ano bastante atípico, o consumo de vinhos no Brasil registrou aumento significativo. A taxa de câmbio elevada certamente influenciou o aumento no consumo de vinhos nacionais, mesmo estando estes sujeitos a uma alta carga de tributos internos. No geral é um bom momento para o vinho brasileiro.
• Além do câmbio, a inflação, a recessão e o aumento na taxa de desemprego obviamente impactam diretamente o setor. Com relação aos vinhos importados, o câmbio desfavorável influi negativamente levando muitos importadores a buscarem vinhos mais econômicos que possivelmente foi a gama de vinhos importados com maior participação em impulsionar o aumento de consumo.
• Em períodos mais difíceis, grande parte dos consumidores tende a manter ou até a diminuir o valor médio do vinho comprado, ou seja, o quanto cada um está disposto a gastar numa garrafa de vinho fica prejudicado. Como consequência a  qualidade média do vinho importado ofertado tende a ser menor, pois a demanda fica muito norteada por preço. É um período que requer atenção e cuidados, pois o mercado tende a ser inundado com vinhos importados de qualidade mais inferior, ou seja, qualidade média costuma cair sensivelmente, para que o consumidor continue adquirindo sua garrafa de vinho pelo mesmo valor de outrora. Assim, é fundamental garimpar bem!  Na minha opinião, nestes tempos bicudos, as compras com melhor relação “qualidade x preço” são mesmo aqueles vinhos que de fato mais consumimos: brasileiros, portugueses e dos nossos vizinhos da América do Sul (Argentina, Chile e Uruguai).
• Segundo a OIV, os aprendizados deste período para o mercado de vinho são a resiliência, adaptabilidade e diversificação de mercados e canais de distribuição.

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