Tokaji e os vinhos húngaros!

A Hungria é o berço do fabuloso Tokaji (pronuncia-se “tocai”), xodó das cortes europeias nos séculos XVIII e XIX e chamado por Luis XIV como “o rei dos vinhos e o vinho dos reis”. Ultrapassou os limites da nobreza, sendo também apreciado por Voltaire, Goethe e Beethoven. O Tokaji é citado até no hino nacional da Hungria! Em inglês, se escreve Tokay.
Um dificultador para se iniciar no universo do vinho húngaro é a barreira imposta pelo seu complicadíssimo idioma. Mesmo utilizando caracteres do nosso alfabeto, ao ler um rótulo, não é tranquilo identificar a uva, região ou produtor. Em húngaro, vinho é “bor” (nenhuma semelhança com vino, vin, wien ou wine); e para ir ao banheiro, num restaurante, depois de calibrado, em qual destas portas você entraria: “férfiak” ou “nök”? O feminino é “nök” e o masculino é o “férfiak”! Toda essa dificuldade é compensada pelo belo país e seus ótimos vinhos.


A Hungria possui 22 regiões produtoras. A tradição vinícola sempre foi forte, mas foi prejudicada durante o regime comunista que fechou o vinho húngaro para o mundo. Com a queda do regime e os investimentos da União Europeia o setor voltou a se desenvolver.
A região de Tokaj-Hegyalja é a mais conhecida, declarada Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, fica a três horas de Budapeste. Lá são produzidos os melhores vinhos brancos secos do país. As castas brancas Furmint, Hárslevelü e Sárga Muskotály são as mais plantadas. Obviamente é nessa região que se produz o famoso vinho doce Tokaji Aszú, verdadeiro néctar.
Tokaj refere-se à região, enquanto Tokaji é o vinho. O “i” em húngaro é possessivo e é correto dizer Aszú de Tokaj ou Tokaji Aszú. Para confundir ainda mais pouquinho, Tokaj também é o nome da denominação e uma das 27 aldeias dentro da região.

O estilo de produção que deu fama ao vinho e a região é o aszú, no qual a uva é colhida tardiamente, depois de atacada pelo fungo botrytis cinerea, que perfura sua casca, criando micro poros, fazendo com que perca água e murche, ficando toda enrugada. O açúcar da uva fica concentrado. Esses cachos botritizados, ou aszú (em húngaro), adquirem aromas únicos e uma incrível doçura. A ação desse fungo é conhecida como podridão nobre. Essas uvas botritizadas, as uvas aszú, são transportadas para a vinícola em recipientes de madeira de 25kg chamados de Puttonyo.

São adicionados 3 a 6 puttonyos para cada barril de vinho base de 136 litros (o gônc). Por isso, nos rótulos sempre há a indicação, normalmente antes da safra, de quantos puttonyos foram utilizados. Quanto maior o número de puttonyos, mais doce é o vinho. Ainda encontra-se no mercado 3 puttonyos, mas a tendência é que sejam elaborados apenas os de 4, 5 e 6.
Tokajis de diversos puttonyos que tive a oportunidade de beber, onde destaco o premiadíssimo Chateau Dereszla 5 Puttonyos 2007:
No Brasil, a maioria das grandes importadoras possui em seus catálogos um produtor de tokaji, entretanto os demais maravilhosos brancos e os interessantes tintos húngaros são bem raros por aqui.
Dentre as ampolas que tive a oportunidade beber/degustar, as seguintes foram as que mais me surpreenderam:

Observe que a última ampola acima é um Tokaji Szamorodni. Szamorodni significa “tal como vem” pois neste estilo de vinho, são colhidas de uma só vez as uvas botrytizadas e as que não foram afetadas pela podridão nobre, diferentemente do Tokaji Aszú, onde a colheita é feita em etapas, de forma seletiva, retirando apenas as uvas atacas pelo fungo. Desta forma o Tokaji Szamorodni pode ser seco ou doce, dependendo do grau de podridão nobre presente na uva no momento da colheita.

Em Budapeste, na rua Parizsi nº 4 (Parizsi utca), uma transversal da famosa Rua Váci (Váci utica) há a incrível loja//winebar Cultivini, onde é possível degustar amostras de vinhos de diversas regiões do país. É imperdível!.


Eu gostei muito do cabernet franc abaixo, bebi no último dia e para minha surpresa o produtor Mészaros possui o mesmo sobrenome das minhas queridas primas que possuem raízes húngaras!
Os cabernets francs húngaros foram mencionados no post: A outra Cabernet!
Os vinhos Tokajis também já foram matéria da coluna Boas Taças que escrevi para o jornal O Sol em 02/10/2015.
Veja os posts:
Deixe uma resposta