A Pinot Noir além do seu reino.

A pinot noir é uma casta francesa, originária da Borgonha, onde é cultivada há mais de 2000 anos. Lá, reina absoluta, sendo considerada por muitos, como a uva que produz os mais elegantes e melhores vinhos do mundo, entre eles, o mítico Romanée-conti. Como toda estrela, ela é temperamental e requer atenção. Exige clima frio e seco, é bastante vulnerável, de difícil cultivo e sua casca é muito fina e sensível. Todo país produtor de vinhos é capaz de fazer um bom cabernet ou chardonnay; mas com a pinot, o buraco é mais em baixo!
Definitivamente é uma casta que não se adapta facilmente em qualquer lugar. Talvez por isso, os mais conservadores desconfiam da possibilidade de se obter bons pinots fora da Borgonha. Será?

Não devemos ser tão extremistas e, como nem toda verdade é absoluta, há experiências muito bem sucedidas de pinot fora da Borgonha na própria França como no Loire en Sancerre ou na Alsácia.
Ainda no velho mundo, mas fora do território francês, há interessantes opções na Alemanha e no norte da Itália (pinot nero).
E no novo mundo? O grande exemplo é a Nova Zelândia, que há muito se destaca como produtora de excelentes pinots; É a principal cepa tinta plantada no país, tornando-o um especialista fora da Borgonha.
Acima excelentes pinots neozelandeses produzidos pela Rippon que tive oportunidade de degustar. Eu já era fã do segundo, mas não conhecia os outros. Abaixo, mais pinots da NZ, sendo que o primeiro é bem popular e em conta, fora do Brasil obviamente.
Nos Estados Unidos, a pinot possui muitos fãs, principalmente após o sucesso do filme Sideways – Entre Umas e Outras, premiado com o Oscar de melhor roteiro adaptado em 2004. O filme, que recomendo fortemente assistir, é praticamente uma ode à pinot noir. Maravilhosos exemplares dessa cepa são produzidos na Califórnia, principalmente nas AVAs (American Viticultural Areas) de Anderson Valley, Russian River Valley (Sonoma), Edna Valley e Bien Nacido; e no Oregon, em Willamette Valley.
Acima, 4 pinots produzidos pelo conceituado Paul Hobbs que é também o enólogo da argentina Vina Cobos. E abaixo mais algumas ampolas californianas que tive o prazer de conhecer, sendo que as quatro primeiras são mais econômicas e fáceis de encontrar nos EUA. O Sonoma-Loeb, está entre as que considero ótima compra, juntamente com o Migration e o Ferrari-Carano.



A seguir, alguns rótulos da minha experiência com os pinots do Oregon. O primeiro é um vinhaço produzido pela Domaine Serene que é uma das vinícolas conceituada de Willamette Valley; e o último, o Erath, é o representante da categoria despretensioso, agradável, barato e fácil de encontrar nos EUA!

Na América do Sul, o Chile é sem dúvida o país onde a pinot obteve os melhores resultados, com destaque para os ótimos vinhos produzidos nos vales de Casablanca e San Antonio, especialmente em Leyda. Gosto muito do Sofia da Garcia Schwaderer/Bravado Wines, do Pinot Noir Amayna, do Ocio da Cono Sur e do Sol de Sol da Viña Aquitania.


Na Argentina, acho que merecem atenção os pinots feitos na Patagônia, nas áreas de Neuquén e Rio Negro. Recomendo os vinhos da Chacra, Manos Megras, e Miras. O Saurus e o Od Vineyard da Humberto Canale também são bons e não são caros. O Miras Pinot Noir é muito bom e meu favorito, mas ainda não o encontrei no Brasil. Trata-se de um projeto do Marcelo Miras, enólogo da Bodega Fin del Mundo. O Saurus é produzido pela Família Schroeder e possui uma linha chamada Select que passa por barrica de carvalho, mas eu prefiro a versão sem passagem pela madeira, pois preserva uma agradável fruta. Seu nome deve-se ao fóssil de dinossauro encontrado na vinícola.



Os vinhos feitos com a pinot noir possuem uma coloração menos intensa do que outros tintos. Em quase todo o mundo se apresentam na mesma forma de garrafa, do tipo Borgonha, que é aquela mais alongada, de ombros inclinados, ficando mais larga ao final. Quase na totalidade são varietais, ou seja, feitos com uvas 100% pinot.

E no Leste Europeu? Sim, por lá há pinots de respeito:

E no Brasil? Pinot definitivamente não é muito a nossa praia, entretanto volta e meia me surpreendo com algumas ampolas interessantes. Abaixo três que gostei muito. Cada uma na sua proposta, o da Angheben foi uma agradável surpresa e uma ótima compra, já o do Atellier Tormentas é muito bom, porém perde demais no quesito custo/benefício! E o Ana Cristina produzido em SC pela Villaggio Bassetti, que foi eleito pelo segundo ano consecutivo o Melhor Pinot Noir do Brasil pela Guia Adega de Vinhos Brasileiros 2017-2018 / 2016-2017.

Por fim, nunca é demais lembrar que a pinot raramente aparece em cortes com outras uvas e normalmente não é adequada para produzir vinhos econômicos de grandes volumes, pois além de dificuldade de cultivá-la, não é tarefa fácil extrair dela cor e tanino suficiente para uma produção com rendimentos altos.
Concordo plenamente que os bons pinots da Borgonha possuem características únicas e são inigualáveis, mas como toda regra possui exceções e o mundo do vinho é vasto e surpreendente, há também, ainda que poucos, outros lugares capazes de produzir com a majestosa pinot noir, vinhos de alta qualidade com identidade própria. Resta provar para conhecer e tirar suas próprias conclusões.
Algumas de minhas reflexões com a pinot noir:
Outras dicas de Pinots em:
- Degustação das expressões da Pinot Noir pelo mundo!
- Dois excelentes Pinots da Califórnia
- Nem só de malbec vive a Argentina
- Roteiro Sideways em Santa Barbara Wine Country
Este post é uma atualização e adaptação da coluna Boas Taças que escrevi e foi publicada em 04/09/2015 no jornal carioca O Sol.
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A produção de leite não escapa a essa evolução.
Olá Fernando Lima.
Aprecio as suas postagens. Seus textos bem escritos, vão direto ao ponto.
Um brinde à página.
Muito obrigado Silvinha! Bjs.